Resenha de "Ideias em Retalho"

13/01/2015 10:35

Alice Ferry de Moraes*

TARGINO, Maria das Graças. Ideias em retalhos: sem rodeios nem atalhos. Teresina: Halley, 2014.

 

O livro publicado pela bibliotecária e jornalista Maria das Graças Targino nos delicia desde o título até o texto 90, não apenas por sua coragem em falar de si mesma, mas principalmente por abordar questões bem atuais da sociedade e das áreas de sua atuação profissional.

Por formação profissional, eu classificava por tema os textos, na medida em que minha leitura era feita. Longevidade esteve presente em 11 textos. Trata-se de um tema de suma importância para os dias de hoje, pois aponta para problemas do amanhã de nossa sociedade. Sobre ele, destaco o texto O terceiro ato da vida (número 36) que fala da fragilidade adquirida com o passar dos anos. O texto Rugas e serpentinas coloridas (n. 37) alerta que “é tempo de viver o que resta para viver”. As lembranças do avô da autora, sempre mergulhado nos seus sonhos dá uma delicadeza ímpar ao texto Desaprender para ser feliz (n. 39). E finalizando os destaques sobre esse tema, afirmo que é reconfortante ler o texto Rotina em cores (n. 40), baseado numa conversa de bar da autora com um amigo sobre a beleza do corpo da mulher madura.

O tema comunicação, segundo a classificação realizada, aparece em 10 textos e inclui as tecnologias de informação e comunicação (TIC). Dois deles, o texto Palavra mal dita ou maldita (n. 24) e É um lindo dia e não posso vê-lo (n. 25) dão destaque ao uso das palavras empregadas para ferir ou impor falsos poderes às pessoas, fato comum nos dias de hoje. O texto Redes sociais em aeroportos e rodoviárias: por que não? (n. 70) denuncia o preconceito dos usuários das redes, autores de análises superficiais do que veem e de demonstrações ansiosas de se fazerem presentes, de maneira desastrosa. O tema educação ficou em terceiro lugar entre os mais abordados pela autora. Foram nove textos, aos quais inclui quatro sobre bibliotecas a posteriori.

As experiências da autora como professora universitária são narradas de maneira crítica e também afetuosa. Optei por comentar os textos sobre as bibliotecas. O texto De livros, bibliotecas e bibliotecários (n. 64) assim como o texto Bibliotecas: Brasil, Alaska e assim sucessivamente (n. 66) ressaltam a importância dos bibliotecários e a sensibilidade inerente a essa profissão e a importância das bibliotecas escolares, infelizmente, ainda vistas como lugares de castigo para as crianças. O texto Leitura poética de uma biblioteca encantada (n. 68) e o texto Sociedade, casarões e livros (n. 65) falam de bibliotecas especiais. O primeiro é sobre a antiga biblioteca da Universidade de Salamanca que me reportou às visitas de bibliotecas europeias que incluo sempre nos meus roteiros de viagem e o segundo texto é uma tocante lembrança de seu pai e a relação dele com livros.

Outros temas foram fonte de inspiração para textos atraentes através dos quais a autora narra episódios de suas viagens às cidades de Barcelona (Espanha), San Andrés (Hungria), Praga (República Tcheca) e Hanói (Vietnã). Consegui viajar através de suas palavras, retornando às cidades que conheço e desejando viajar para as cidades que não visitei. O tema amor está muito presente em diversos textos de maneira muito especial. O texto Um grande e antigo amor (n. 19) é curto, mas resume tudo que li sobre o mal de amor, trazendo comoção sem ser piegas. Já o texto Vou à missa como o “vestido de domingo” (n. 90) finaliza o livro com “chave de ouro.” Nele, Graça fala de sua vida, sonhos e desilusões e pergunta: quem sou eu?

Como leitora pude perceber que você é tudo: de menina em João Pessoa, adolescente em Recife e dona de casa de Piripiri / Teresina à acadêmica de Salamanca. Uma mulher preocupada com os problemas da sociedade e que se emociona no seu cotidiano. É mulher corajosa no seu trabalho e na vida pessoal, desnudada em seus textos, ao relatar sua fragilidade diante de seus fracassos amorosos e seus sentimentos mais íntimos.

Diante da grandeza de seus textos, me senti pequena e me flagrei refletindo sobre a vida, que mais parece uma colcha de retalhos de acontecimentos, com os quais temos que lidar sem rodeios nem atalhos.

 

* Bibliotecária e jornalista. Mestre e Doutora em Ciência da Informação. Pós-doutora em Estudos Culturais.

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